O lançamento de um CD, previsto junho, é apenas um detalhe, neste movimento que veio pra valer e gerar mudanças
Keka Werneck
Da Reportagem
Um nome sugestivo para um marco. “O Caminho da Resistência” é o título do primeiro CD (álbum oficial) do rap de Mato Grosso. E se refere à seta que o movimento hip hop tem sido para a juventude da periferia, indicando luz no final de um túnel bem escuro e cumprido. Para muitos, este facho luminoso mostra o rumo de volta do mundo do crime, da marginalidade, da exclusão. Onde o hip hop tem se feito presente vale o discurso do possível contra o da descrença, da auto-estima contra o racismo, da expectativa de vida contra a eugenia juvenil que se assiste hoje entre adolescentes. Na voz do rapper Linha Dura, 26 anos, e nas mãos do DJ Taba, 29, o que surge neste trabalho discográfico é mais do que um produto, eis a voz da periferia masterizada.
O lançamento está previsto para junho.
“Com este CD esperamos chegar onde nossos braços, nossas ações, nossas oficinas não alcançam”, explica DJ Taba. Ele se refere à Central Única das Favelas (Cufa), movimento social que surgiu na Cidade de Deus, Rio de Janeiro.
Liderança nacional da Cufa, o rapper MV Bill também condensou esta bandeira de luta em produto cultural: o documentário “Falcão – Meninos do Tráfico”.
Outra referência do hip hop, Mano Brown lidera os Racionais MC’s e dissemina letras que são feito lanças a penetrar as vísceras sociais, sem pena, sem dó, sem licença, sem máscaras ou eufemismos.
É assim, neste intuito de ação, ideológico, social, cortante, que aporta o CD “O Caminho da Resistência”.
“Uma extensão da Cufa em Mato Grosso”, resume DJ Taba.
E quebra paradigmas, não só por ser o primeiro disco oficial do rap de Mato Grosso. Mas é ainda o primeiro CD que sai com incentivo de lei. “Que antes só tinha espaço para a cultura do caju”, alfineta o rapper Linha Dura.
Sai pelo selo Tchapado Groove. Está sendo pré-gravado no Boca de Disco e a finalização será feita no Estúdio Inca.
O disco é um tentáculo de um trabalho diverso e incansável da Cufa Mato Grosso. De sol à sol, em favor da juventude nascida e crescida na periferia das cidades, Cuiabá e interior (Sinop, Barra do Garças e Primavera do Leste).
São três anos de suor a serem completos no dia 22 de abril. Um domingo que será marcado, a partir das 16 horas, pelo mundo do hip hop, dança, música, militância, convidados, quem quiser ir. Com participação especial do projeto Flauta Mágica, oriundo do mesmo bairro que é berço da Cufa, em Cuiabá, o Jardim Vitória. Ali vão sobrar exemplos de que o jovem, mesmo o que já viu e viveu o crime, tem jeito. A Cufa é a força que faz ruir teorias da descrença com essa moçada chamada de violenta e bandida, que mata e morre. Tira o ócio, põe ofício, travestido de arte.
Pack Noleh, 20 anos, grafiteiro, puxa gente do fundo do túnel, no Complexo do Pomeri. O desenho, a expressão artística, faz fluir em cada reeducando a possibilidade de fato de se reeducar, repensar a vida, sabendo da possível via que é o crime, conhecendo, porém, outras pegadas, a escolha pela paz construída na garra. “Através da imagem, talvez possam chegar a alguma conclusão sobre a própria vida”, acredita ele. O grafiteiro faz performances em shows da dupla Linha Dura e Taba.
Então, muito prazer, esta é a ideologia hip hop. “Uma revolta, um sentimento de inconformismo e ainda também uma forte espiritualidade e a veia de protesto”, resume Linha Dura. “Este disco, O Caminho da Resistência, não é um CD que representa somente nós, mas sim uma pá de desgraçados que vivem a mercê, num mundo desequilibrado”.
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